Determinantes sociodemográficos da insegurança alimentar nos domicílios de estudantes de escolas públicas : uma investigação longitudinal.
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Data
2023
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Resumo
Introdução: A insegurança alimentar é um marcador de desigualdade social e
correlaciona-se à falta de acesso regular e permanente a alimentos adequados em
quantidade suficiente, incluído também a preocupação com a obtenção de alimento no
futuro e comprometendo o acesso a outras necessidades básicas. Fatores
sociodemográficos estão diretamente associados a ocorrência de insegurança alimentar
domiciliar e podem afetar a população de forma desigual. Com o surgimento da pandemia
da covid-19 em 2020, ficou mais evidente as alterações na dinâmica dos indicadores
sociodemográficos que influenciam a segurança alimentar. Objetivo: Examinar a trajetória
de mudança na situação de insegurança alimentar e seus fatores associados nos domicílios
de estudantes da rede municipal de ensino de Mariana e Ouro Preto entre 2020 e 2022.
Métodos: Esta tese faz parte do Estudo da Segurança Alimentar e Nutricional na Pandemia
da covid-19 (ESANP), que foi conduzido com amostra probabilística e estratificada dos
estudantes e possui delineamento longitudinal. As coletas de dados ocorreram em quatro
momentos: T0 (linha de base) em junho e julho de 2020, T1 de março a maio de 2021, T2
de dezembro/21 a janeiro/22 e o T3 de setembro a novembro de 2022. A partir, dos dados
do ESANP, foram traçados três objetivos específicos, sendo o primeiro com delineamento
transversal para descrever a relação da insegurança alimentar, condições socioeconômicas
e variáveis relacionadas à pandemia da covid-19 na linha de base. O segundo objetivo teve
delineamento longitudinal e permitiu conhecer a trajetória e os perfis respostas sobre a
insegurança alimentar e as condições domiciliares, no terceiro objetivo procedeu-se a
modelagem longitudinal da influência de variáveis fixas e aleatórias nas mudanças de
respostas sobre a insegurança alimentar. A variável desfecho foi a insegurança alimentar,
medida por meio da Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA). Para responder ao
primeiro objetivo específico a insegurança alimentar foi analisada como variável
categórica: insegurança alimentar x segurança alimentar e as variáveis explicativas foram
divididas em dois blocos i) variáveis sociodemográficas e ii) variáveis relacionadas à
pandemia da covid-19. Os dados foram analisados por meio do cruzamento de cada
covariável com a variável desfecho pelo teste qui-quadrado de tendência e por regressão
logística binária. Para responder ao segundo e terceiro objetivos específicos, a insegurança
alimentar foi tratada como variável numérica discreta a partir da soma da pontuação da
EBIA, denominada nesse estudo de escore de insegurança alimentar. Foram conduzidas
análises descritivas de perfis de resposta, gráfico box-plot e tabela de frequência do escore
de insegurança alimentar em cada tempo visando avaliar as mudanças e tendências ao
longo do tempo. Os tempos foram comparados dois a dois por meio do teste de Wilcoxon
Pareado, com correção de Holm. Foram construídos modelos mistos generalizados a fim de
estudar a relação entre o escore de insegurança alimentar e variáveis explicativas de
interesse ao longo do tempo. Por fim, para compreender a relação interseccional das
características do chefe da família e mudanças no escore de insegurança alimentar, foram
construídos modelos generalizados mistos entre as principais variáveis interseccionais
descritas na literatura (raça/cor da pele, sexo e estado civil, sexo e renda familiar, e
localidade da residência, área urbana ou rural). As análises estatísticas foram realizadas nos
softwares Stata 13.0 e Jamovi versão 2.3.28.0 ao nível de significância de 5% para todos os
modelos, ajustados por fatores de confusão. Resultados: Foram avaliados na linha de base
612 domicílios, sendo que 82,0% (n = 502) apresentavam algum grau de insegurança alimentar. A insegurança alimentar foi associada ao número de crianças no domicílio
acima de três (OR: 2,17; IC95%: 1,10-4,27), ao acesso à cesta básica (OR: 1,64; IC 95%:
1,04-2,58) e a diminuição da renda durante a pandemia. Nossas análises longitudinais
revelaram que houve tendência de diminuição na média do escore de insegurança alimentar
ao longo do tempo. O escore médio diminuiu de 2,9 e 2,7 em T0 e T1 para 2,2 em T2 e T3
respectivamente. As diferenças entre as médias do escore de insegurança alimentar foram
observadas na comparação T0 com T2 e T3, e entre T1 comparado ao T2 e T3 (p-valores <
0,001 e 0,017 respectivamente). Nossos dados evidenciaram ainda que a redução do escore
de insegurança alimentar correu de forma desigual em muitos dos grupos estudados. Para
famílias extremamente pobres, houve aumento do escore de insegurança alimentar ao
longo do tempo (p<0,001), comparado as famílias que tinham renda entre 1 e 2 e entre 3 a
6 salários-mínimos. Nossos modelos mistos generalizados demostraram que as variáveis
explicativas associadas a maior escorem de insegurança alimentar foram renda familiar de
até meio salário-mínimo, estar cadastrado em programas sociais, ter recebido recebimento
de auxílio emergencial, ter recebido cesta básica de alimentos e maior número de crianças
no domicílio. Também observamos que fatores interseccionais do chefe da família foram
associados a maior escore de insegurança alimentar. Na comparação entre raça/cor da pele
e sexo, tanto mulheres (RT: 0,47; IC95%: 0,33 – 0,68), quanto homens (RT: 0,37; IC95%:
0,25 – 0,54) autodeclarados como brancos tiveram razão de taxas de insegurança alimentar
menor quando comparados aos seus pares não brancos. As mulheres casadas tiveram
escore de insegurança alimentar menor (RT: 0,64; IC95%: 0,47 – 0,86) que as mulheres
não casadas. Comparado às chefes de família mulheres que residem em áreas rurais, os
homens residentes em área urbana (RT: 0,49; IC95%: 0,45 – 0,67) e residentes em área
rurais (RT: 0,49; IC95%: 0,32 – 0,69) possem menor razão de taxas de insegurança
alimentar. Conclusão: Nossas análises permitiram conhecer a situação de segurança
alimentar nos domicílios dos estudantes de escolas públicas durante o período de
suspensão das aulas presenciais em função da pandemia de covid-19. Conclui-se que,
embora tenha havido redução da IA ao longo do tempo para a maior parte dos domicílios
estudados, essa tendência de declínio não ocorreu para as famílias pobres e extremamente
pobres. Nos lares chefiados por mulheres não brancas, mulheres não casadas, mulheres
residentes em área rural a situação de IA foi pior ao longo do tempo comprado aos seus
pares homens. Assim, espera-se que essa pesquisa possa contribuir para o conhecimento
dos fatores que influenciam e determinam a segurança alimentar em nível local/regional
não só para gestores públicos, mas também para líderes de movimentos sociais e instâncias
locais de participação social, que podem conjuntamente propor ações e políticas de
mitigação da forme e da insegurança alimentar com base em resultados científicos
adequados as necessidades regionais.
Descrição
Programa de Pós-Graduação em Saúde e Nutrição. Escola de Nutrição, Universidade Federal de Ouro Preto.
Palavras-chave
Insegurança alimentar, Pandemia, Covid-19, Alimentação escolar, Desigualdade social
Citação
RODRIGUES, Erica Costa. Determinantes sociodemográficos da insegurança alimentar nos domicílios de estudantes de escolas públicas: uma investigação longitudinal. 2023. 218 f. Tese (Doutorado em Saúde e Nutrição) - Escola de Nutrição, Universidade Federal de Ouro Preto, Escola de Nutrição, Ouro Preto, 2023.